terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Poesia (23.7)

Mil Vezes Ou Menos

Os cabelos no rosto;
As palavras esvoaçam
Cortinas dos pensamentos.

O céu colore olhos;
Cinza –
Cor munida
De esperança.

Chove na praia,
Lavam-se embora as preocupações.

Melancólica surdina
É a vida à espreita,
Preparando-se.

Que estilhace meu peito
Trovejando veias,
Dentro dos ossos,
Pela nuca,
Ao redor do pescoço.

Que estilhace nos olhos cinza,
Mil vezes ou menos,
O necessário.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Poesia (23.6)

Verbal

O lençol,
A cama,
O casal,
Noturnos.

O ronco,
A gata,
O sono,
Acordados.

O outro,
A dor,
O fim,
Doídos.

O um,
A noite,
O copo,
Solene.

O dia,
A dor,
O dizer,
Culpado.

O azul,
A nuvem,
O branco,
Suspirante.

O antigo,
A saliva,
O retorno,
Incerto.

O medo,
A coragem,
O fim,
Rotineiro.

O choro,
A lágrima,
O grito,
Moído.

O respiro,
A saudade,
O caminhar,
Preciso.

O novo,
A água,
O céu,
Bonito.

O eu,
A casa,
O alívio,
Surpreendido.

domingo, 22 de novembro de 2015

Poesia (23.5)

As Raízes dos Baobás

O sangue segue no rosto
Já desumanizado,
Sujo de terra desconhecida;
Fluxo perdido,
Vasto e viscoso,
Normatizado,
Gotas enquadradas
Em manchetes.
Sangue esse nosso,
Humano sem questionamento,
Que humaniza alguns
Destrutivos
E esgota música em outros.

Gritos agudos que rasgam o céu
Único.
Pródigos gritos que humanizam dores,
Sem religião ou pátria.
Que cobrem os olhos de cinza
E somem entre as cores da vida.

Meados de dias tranquilos
Esturricam com gritos sangrentos
Que violam olhos e ouvidos.
Provam esses gritos e sangue
A humanidade de outrem,
Destravam paisagens,
Sintomatizam comunidades.
E não,
Não representam a crueldade de todos,
Sangue em nossas mãos,
Nó nas gargantas,
Redenção extraviada,
Sigamos juntos!

Não deixemos os olhos cobertos
De sangue e medo,
Vajamos os lados,
O céu,
Os cachorros mancos,
As vitrines,
As pernas que resistem!
Vejamos o outro,
Como vemos espelhos.

Ouçamos além dos gritos!
As canções de amor,
Os pães,
Os uivos apaixonados pela vida,
Os barulhos dos motores,
As melancólicas badaladas dos sinos,
E a voz do outro,
Como nos ouvimos em preces noturnas.

Ouçamos e vejamos
Que somos vários

E um só.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Poesia (23.4)

Sal

Em dado momento
Percebo o dia que nasce.

Solto os travesseiros,
Bocejos,
Esticam-se os membros,
Uma lágrima ébria desce;
Descompasso claro.

Abro na janela uma fresta,
Sento-me com ombros curvados;
Bocejos.
Outra lágrima titubeia
Minhas bochechas
Fazendo graça.

Não vejo você.

Deito, logo.
Fecho a fresta da janela,
Encolhem-se os membros,
Acolho-me em meio a travesseiros,
Deixo o dia nascido para trás.

Escondo meu rosto entre as mãos,
Coagula o sal em minhas bochechas;

Vejo você nos sonhos
Onde as ondas do Mar
Lambem meu rosto por fim.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Poesia (23.2)

Oscitação das Borboletas

Perdem-se
Na mansidão de minhas orelhas.
O sono que vem
Desdobra-me.

Sinto pele,
Chão,
E frio principalmente.
Desfrutam das horas
Emudecidas e pasmas.
Calou-se o vento dantes mesmo
Dos soluços das árvores.

Calo-me em círculos
Que ondulam vozes.
Mordo dentes
Sórdidos
Dentre palavras.

Vejo relampejo de nomes.

Tremores atingem-me
Sem pudor.
Desavisadas águas lambem
Minhas bochechas.

Caio em choque,
Resta no sangue
O esmero de outrora
E um ardor.

Desprovidas de espaço
Esvoaçam as cortinas
Do meu estômago.

Calo meus bocejos.
Seguem desatinas,
Morrem-se no vento
Fracas e sem destino.


quinta-feira, 16 de julho de 2015

Poesia (23.1)

Skipping Heartbeat

Keep me around
When there’s no need
To be found
So my heart
Won’t meet the ground
In case of 
Falling in love.

I feel like writing
Epic poems
Whenever you’re by my side,
I just try
Not to sound, seem, look or smell
So obvious.

But I can’t, can I?

We’re smart boys,
And that’s love already
Somehow.

Love.
That’s an odd word, you know?
I wouldn’t expect that to happen
So rapidly devastating.

It’s good be warm again,
To belong to someone
(And to myself
For the first time)
And for all the times
That might follow.

I hope to die in your arms.

Oh, your arms…
There are no enough words
To describe them,
I don’t even know
The reasons
For me to be here
Effortlessly hitting my head
Against the wall
While trying to describe your
Unhuman
Cozy
Dorky
Strong
Arms.

I would wrap them
Around my neck
If I were taller than you,
Since I’m not
I'm glad to have them
By my side,
Hugging my soul
And mending all the broken pieces
Of myself
That were once
So abruptly wrecked.

I guess my messy poem
Will do it for me,
I will describe all those sentiments
In a childish,
Lacking maturity,
And all over the floor poetry
And that is how I’m able to expel
Those unsaid words
That are been chewed inside my mouth
Whenever you’re around.

I’m here whole again,
Seeing a sparkle from my own eyes
And blushing my cheeks
To your silly little jokes
That crack me up
And melt me down.
Oh,
How I’ve missed
This place.

This warmth,
This chill,
This skipping heartbeat
That found in you
Not life,
But a piece of myself
That you helped me clean
And put out
To shine.

Gratitude is a word
That runs along my cheek
And lays in your heart
Pressed towards mine
Making us share
This mutual tear
So our hearts will forever know
How to never let love
Disappear.

domingo, 14 de junho de 2015

Poesia (23.0)

Há Mares

Aquietou-se o mar.

Lamentam na vagarosidade
Os sargaços e as conchas.

Sem pegadas na areia
Nem embarcações ancoradas.

Acalmaram-se
As velas,
Os vivos,
Os corações.
A paz não inunda,
Nem amor aqui chove.

O mormaço abraça o molhado
Num uivo
Audível por cantos inóspitos
E por toda a costa
Que carrega o peso
Desse mar na vida.

O último vislumbre que tenho
Na minha irônica memória
É do mar indo em frente,
Seguindo sua maré
Que se recolhe.
Sempre na direção oposta
Aos meus beijos.

Um mar partido
Torna-se terra,
Ou se separa então
Em oceanos
Divididos por regras dos homens
Que não justificam
O prazer de fazer parte
Das mesmas águas.

O mar seca hoje,
Retrai-se,
Molha-se,
Enxuga-se.

Indeciso não sabe
Que seu balanço
É guiado;
E que lua alguma
Sabe sequer
De sua existência.

domingo, 24 de maio de 2015

Poesia (22.9)

Lungs

Lacking air,
Surrounded by water,
A storm approaches
To mix the sea
And the sky
Making my eyes glaze
Into darkness.

The depth I am to feel
In losing myself
Is the one I have never felt;
Yet to come is the sun.

I wait for it crying,
I loved it tenderly,
I lost it wildly,
I miss it deeply.

Come, Sun!
Fill my bones with metal
And my heart with light
So I can walk again
And again as myself
I'll be able to rise.

Texto (0.6)

Labirinto de Ar

O ar estava pesado. Tinha um cheiro pesado. Viscoso, de cor esverdeada. Não sabia como entrar em casa. Ou sequer se estava seguindo em direção a uma casa. Meus olhos ardiam. O coração estava descendo vagarosamente em direção aos meus pulsos enquanto o ar estrangulava meu pescoço no qual minha jugular lutava bravamente.

Não quero sair daqui. Não quero deixar tudo isso cair no estojo antigo de lápis quebrados que é o meu passado. Não quero deixar você ir de mim. Guardei por tanto tempo você aqui que não sei o que fazer com o pouco espaço que ocupava na minha gaveta coberto com uma fronha antiga, dormindo todo enrolado, mas com os pés pra fora; ou no meu bolso que carregava você aonde eu fosse.

Quero descansar. Descansar desse pesadelo que é não ter você, ou ninguém. Desse apego que eu não sei chamar de amor. Desse amor que eu sei que é só apego.

Não vão brilhar outras noites, vão?

Eu queria ter tido alguém como eu; eu sinto falta de mim. Tanta falta que nem sei por onde começar a me procurar. Lembro-me de encontrar você na praça e de não aguentar o sorriso enquanto andava em sua direção e um abraço frio era tudo que eu tinha em troca. Não que você não quisesse o meu calor, você apenas não podia me aquecer mais. E era frio. E o frio se espalhou pelos meus ossos e destroçou meus olhos sangrando gelo no meu sorriso. E hoje quando vejo você, tremo de frio.


Não podemos chamar de lar o que construímos. O mais próximo que consigo chegar de alguma edificação do que tivemos ou mesmo temos é um labirinto. As paredes aqui mudam de lugar, os quadros nas paredes são fotos de viagens que na memória ficaram bonitas, mas qualquer transeunte vê os borrões nos meus olhos. Desse labirinto preciso sair correndo, e olhe que desaprendi a correr; seja em sua direção ou na direção oposta. Nesse labirinto eu flutuo. O que me carrega é esse ar denso, repleto de umidade das lágrimas que derramo ainda ao som de algumas músicas. Flutuamos, creio eu, nesse labirinto, ao som de nós dois chorando. Que vença não o melhor, mas o mais corajoso. 

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Texto (0.5)

Amanhã

Não há personalidade alguma guardada no futuro, apenas contradição.

Existem sim pessoas que esperam um amanhã mágico e estrelado. Pessoas ingênuas de coração partido em pequenos cacos perdidos no jardim de grama alta. Dentre essas pessoas estou eu. Cá, alimentando essa magia fantasiosa do futuro.

O passado está cheio de mágoas e abraços apertados. Também no passado se encontram famílias felizes e brigas sem motivos. Está guardado no passado um amor estranho e brilhante, que não quero mais. Logo fico, quando me permito olhar pra trás, tonto; desnorteado. Tanta coisa mudou e tantas pessoas, milhares se posso eu imaginar seres humanos matematicamente, passaram por mim. Os encontrões foram muitos também. Dessa tontura tiro a fadiga de ter esse passado inteiro só meu. Não imaginava que tanto fosse ser vivido por mim.

Então o presente. Lugar de reclamações e planos. Onde sou interrompido por banhos e faxinas. Espaço que aprendi a amar de pertinho, foi o presente. Aqui me dou meu espaço, bebo minha água, subo e desço escadas, e por fim também durmo. Como é bom dormir.

Não quero ser levado a mal, nem muito menos mal interpretado. Gosto muito de quem sou, do que me tornei; as decisões que tomei, as certas e as piores possíveis, me  trouxeram a ser quem sou. A comichão que fica no peito é, na verdade, uma ansiedade incontrolável de ver a vida toda. Isso mesmo. Tudo. Quero ver tudo. Cada lugar do mundo, cada pessoa, beber cada suco de cada fruta estranha; provar os mais diversos beijos, experimentar as diversas roupas que o mundo pode proporcionar.

Mas tudo isso só vai acontecer amanhã. Hoje, por enquanto, estou de pijamas. Já já me levanto para atender a porta, e o amanhã há de começar. E espero que o amanhã não se torne passado tão cedo.

domingo, 10 de maio de 2015

Poesia (22.8)

Grateful Melancholic Sunday

When happiness strikes
In the middle of a melancholic Sunday
I shed a tear of mixed
Unknown feelings.

With my little yet brave age
I have learned
That happiness has always been
A choice
And a state of mind.

And boy oh boy
I have made my path
With a constant struggle
And an open chest;
Must no one tell me
Otherwise.

When happiness strikes
Through a song,
A hummingbird sound,
A piece of bread,
Or an instant of reasonless delight
I do shed my tears inside out
And no shame will be felt
For my bravery
Nor for my weakness
In being able
Just
To
Merely
Feel.

quinta-feira, 7 de maio de 2015

Poesia (22.7)

Last Grief

Crying inside
For the infortune lack of tears.
Second chances
Have been overused
In order to fill the void
Of me.

I promised ourselves
A limitless number of things,
Things I myself
Could never accomplish.

My body crawls to you
In the deepest night
But regardless of what you never did
To keep us alive,
I am living
For my own self,
And have I prohibited
My thoughts
To get to you
Even when I scratch my bed
In the deepest desire
Of your burnt  body.

So long…

There’s nothing left
For us to say.
No words were left
Unspoken.
No song can mend this.

No letter you send me,
No scream at my door,
No tear shed in my bed,
Will make amends.
It is over.
For good.
For the better.
And my last howl into the night
Shall let the door closed
Once and for all.

So long.

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Poesia (22.6)

Find Me

My hands ran again
As fast as the wind
But could not cover my mouth
Nor my eyes.

I missed you for a second,
All the wrongs,
My rights...

Then I’m here
Crying my way through the drizzling night,
Craving our names
Into the back of my bed
Where I’d see us
While I sleep.

Your happy face,
Your cute little smile
Celebrating.
I do hope you have found
A warm place
Where you are to ride along
With your dreams.

Happy I am
For you,
Cannot for me yet I be
Shall happiness I am to find
In seeing myself
Alone.
Just I.

domingo, 12 de abril de 2015

Poesia (22.5)

Motriz

Nos finais de semana
Descanso.
Danço tudo que tinha que dançar,
Deixo cair lágrimas em copos de plástico
E bebo tudo de volta de uma só vez
Com sal e limão.

Nos finais de semana,
Descaso.
Vejo os filmes que tinha de assistir
E faço maratonas agarrado
Aos meus travesseiros,
Os dois melhores amigos que tenho
E que não me deixam nunca;
A não ser no meio da noite
Quando um deles
Sempre teima em ir ao chão.

Durante os finais de semana
Descasco beijos de estranhos,
E nos abraços apertados de amigos
Me encontro;
E me aqueço nos cigarros emprestados.

São os finais de semana que me arrastam
Pela semana toda,
Como quem come as bordas do sanduíche
Para aproveitar o recheio mais pulsante.

Nos finais de semana também
Findo.
E me deixo pra trás aqui e ali
Nem sempre voltando
Para esses pontos;
Mas sempre querendo partir.

quarta-feira, 8 de abril de 2015

Texto (0.4)

Fenestra

Passei por vários quartos até chegar a esse. O atual. Minha infância e parte da minha adolescência foram na casa de vovó. Lá meu quarto era confortável, sem muita privacidade, mas com força de vontade e muito aperreio, construí a minha própria. Podia trancar a porta do meu quarto aos doze já: ver televisão, ler um pouco, ouvir música num volume alto nos meus fones de ouvido com fio extensor que me permitiam fazer outras coisas enquanto escutava música. Não tinha muito barulho, mas como casa de vó, sempre tinha gente batendo na porta para falar comigo.

Já o meu segundo quarto, na casa dos meus pais, não tinha janela. Tinha uma porta sanfonada que dava na cozinha, e sempre muito barulho vinha da cozinha, porque era, claro, a cozinha da casa. Fora o cheiro de comida que nem sempre era agradável. Por não ter janelas, fazia muito calor e o ventilador de teto não dava conta do recado. Depois de um tempo e de muita birra troquei de quarto na mesma casa. Fiquei com a suíte. Ainda assim, por mais que tivesse uma janela grande, seu basculante não dava em lugar nenhum; o quintal não tinha nada a se ver, nem mesmo me mostrava nada de interessante. Foram mais uns oito anos nesse quarto com uma janela morta.

Então, ano passado, nos mudamos. Primeiro apartamento. Primeiro andar. E uma janela verticalizada, não muito larga. Relutei para colocar rede protetora, mas, como minha irmã ainda é pequena, acabei cedendo às pressões de mamãe.

O que vejo não é muito. Um prédio alto a alguns metros, a rua pouco movimentada; mas o céu, ah, o céu... Vejo-o se apoderando de tudo daqui da janela. O sol gritando sobre os meus olhos assim que raia. Escuto pássaros e insetos brincando na árvore que cobre quase toda minha visão do mundo. Que janela!

Aprendi a gostar do barulho dos pássaros de manhã cedo, de observar o ritmo alternante das luzes dos apartamentos que enxergo. Não tenho a vista do mar, nem muitas vezes da lua; não queria tanto talvez. O que vejo é a vida lá fora, existindo no seu ritmo. Através da minha janela aprendi a me ver mais, a deixar meus pensamentos correrem soltos pelas noites onde o canto é o dos carros que passam ao longe. No meu quarto, a essa hora da noite, escrevo no céu com meu olhar; e ele escreve de volta em mim em uma língua que agradeço por não conseguir decifrar.

terça-feira, 7 de abril de 2015

Poesia (22.4)

Que Seja

Que me agarrasse pelo braço,
Que saíssemos aos berros
Sendo altos
E no prazer das alturas
Encontrássemos um ao outro.

Que soubesse do açúcar que gosto
No chá,
Das colheres de amor
Que correm nas veias.

Que trouxesse areia
Aos meus pés
E que praias lindas visitássemos.

Que beijasse minha mão
Na fila da padaria
E minha bochecha avermelhasse toda
Querendo retribuir;
E que retribuísse.

Que abraçasse minha dor
E essas malas pesadas
Amarradas aos meus cadarços
E soltasse tudo pela janela
Do primeiro andar
Olhando para baixo
Não querendo machucar ninguém.

Que mastigasse minhas orelhas
Na madrugada tenra
Com os mais belos poemas
Derretendo meus olhos
E avermelhando minha barba.

Que me amasse como eu amo.
Já bastava.

Poesia (22.3)

Ei

Nego,
E esse carinho todo,
Faz o que com a gente?
E essa mordida
Nos sinais da minha pele,
Faço o que elas?
E com as marcas, nego?
E com as marcas
No meu corpo
Que você deixou nesse tempo todo;
Elas saem, nego?
Saem?
Tu acha que vão assim,
Do nada,
Embora?
Fala pra mim, nego.
Me diz que vai ficar tudo bem,
Que meu peito vai fechar,
Que teu corpo vai tá aqui comigo
De novo e de novo
Nessa saudade torta
Que faz da gente um só.

Ah, neguinho,
Até quando vai ficar aqui
Esse calor todo?
Até quando, nego?
Até quando vai ser sexta-feira no meu peito?

Vem, dengo, vem.
Me faz feliz,
Brinca com minha orelha,
Beija meu ombro,
Cheira meu cangote,
Sem querer
Deixa cair a roupa,
Faz o que de mais pagão
A gente tem pra oferecer.

Depois vai, nego, vai.
Some da minha vida
Deixando rastro pelos seis cantos
Da minha casa.
E deixa essa saudade aqui
Porque sem ela eu fico só.

domingo, 5 de abril de 2015

Poesia (22.2)

animação por Leandro Lyra


Segundos

Incrédulos.
Secos.
Adjetivados à desnecessidade.
Que me fecham o mundo.
Que deixam de existir
Os outros.
Não vêem o que não quero que vejam.
E não hão de abrir para quaisquer
Imagens.
Fechados sem porta
Encontram no vazio
De seu fundo
Janela de algumas almas;
Não pensaram que nem todo corpo
Carrega consigo
Um pedaço do divino,
Algumas cascas
Estão soltas
Para serem pisadas
E apenas fazem algum barulho
Quando quebradas,
Outras espumam recheio
Antes mesmo de serem tocadas.

Com a branquidão ao relento
Não há cor que seja mais pura
Do que aquela que se escolhe ver
No outro.
E piscam os olhos
Sem saber o que ver
Na tentativa inócua de atingir
O sublime.

Piscam os olhos
Abrindo-se ao mundo
E por fim morrendo diante
De tanto.
Escolheram o vazio da penumbra,
Do escuro,
E da porta cerrada.
Não mais abertos
Desejam estar. 

Texto (0.3)

Estalos

Tenho uma poesia a escrever, mas ela não sai. Em prosa se fazem as palavras uma vez perdidas em versos. Encontro outros números, outros sentimentos, outros rapazes e moças perdidos como eu. Tenho um conto a escrever, mas só versos chegam a minha mente. Não penso em histórias fantásticas nem muros altos que só os contos contam. Penso no movimento das minhas mãos quando escuto seu nome. E contos não são escritos sobre movimentos de mãos. Ou são? Os meus não serão.
Escrever tornou-se a terapia que não me é cobrada. Um momento íntimo tal qual tomar banho, fazer um café no meio da madrugada, ouvir o barulho dos carros em sinfonia urbana ou até mesmo fazer amor. Escrever tornou-se o que precisava tornar-se; a pausa excêntrica da minha labuta cordial com o mundo. Então caminho em direção às letras soltas para trazê-las à vida. Não que letras soltas não tenham vida. Um A me diz muito mais do que muita gente já tentou compor em sintonias de horas de palavras. Mas busco um balanço sem ritmo próprio nos meus As e Bs, também nos meus Cs.
Queria dizer tanta coisa, mas com meus silêncios, poucos que tenham sido, aprendi a calar; consentir nunca foi meu forte, porém há momentos de necessidade em que palavras perdem seu propósito e ganham vida em meu rosto, meus braços, meus olhos e minhas mãos principalmente. Minhas mãos são as janelas que meus olhos jovens não conseguem ser. Vê-se nelas o que passei, e também por onde passaram. Por rostos desconhecidos, por corrimões, copos e talheres e pratos e cigarros e outros copos e mais rostos desconhecidos e alguns corpos e meu corpo e meu rosto e minhas lágrimas e meu cabelo e sangue meu e minha respiração que não pode ser segurada.
Respirem, mãos. Segurem esse cansaço que vem à frente, pois não há quem segure o que minhas mãos seguraram. O meu peso. Minhas lágrimas. E todo o meu amor. 

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Texto (0.2)

Finde

No fim fica esse sentimento todo. Essa tristeza imensa guardada. Palavras que secaram e não sabem mais para onde seguir. Meu desespero em apontar dedos. Minha enorme, imensa, indiscutível tristeza guardada; que pensa no tanto que poderia ter sido feito para que a vida continuasse caminhando. E me martelo lembrando que isso aqui é só solidão falando. 

No fim ficamos sós, sem um ao outro. Conto nos dedos as saudades, os suspiros, as vezes em que penso em você não cabem nem em minhas mãos. 

No fim fico eu. Permaneço desnudo e ensanguentado, virado do avesso, odiando o passado irracionalmente; tendo o futuro na prateleira empoeirando já, quase gasto está o futuro. 

No fim estão os abraços rápidos, sua cara amarrada por pequenas meninices, as comidas frias, as músicas que não podiam ser cantadas, meu peito enorme que queria ter te dado o mundo e você não soube querer. 

No fim sou eu quem chora na noite quente de Recife, que não tem ar-condicionado que esfrie ou seque minha dor. A dor de tentativas frustradas. Dos desamores e desgostos dados. Que minha inconsciência culpa você sim. Que não nego que dói muito. Que minha dor é só minha e que ela não vai embora por medo de que sem ela eu fique de vez completamente só.

No fim findamos. Findei. Por não aguentar mais as birras e os trejeitos específicos que me tiravam do sério. Tive eu que ir lá, depois de todo o arrastar sanguinolento, e terminar tudo. Como uma festa que fracassa e ainda tenho a dor de limpar o salão. Como uma vida celebrada na ironia.

No fim morremos, eu sei, então logo não é o fim ainda. Mas de fins em fins morro um pouco. E nem mais posso dizer que está desgastado meu coração, afirmo apenas que ele também se findou. Mandei para o conserto do tempo e a minha teimosia há de regrar esse retorno. Findei-nos sim, e o faria seis vezes de novo, para cada ano de sofrimentos e alegrias juntos. Findei-nos por não ter outra saída. Você não me deu nenhuma.


sexta-feira, 27 de março de 2015

Poesia (22.1)

Biológico

As feridas fecham
Em tempo dos curativos irem-se.

Não espere borbulhar a água
Sob o constante atino
Do olho vão.

Há de fechar em seu tempo
A dor de ontem.

Meu bem, escutes:
São ondas que chegam.
Da maresia se fazem conchas novas.
Carregando pérolas,
Endividando senhoras,
Apaixonando moças.

As feridas fecham
Ao tempo que meu coração se lava
Num processo biológico
No qual se espalha
E se recolhe.

Se espalhe
Deixe o mar sangrado levar-te.
Lavar-te.
As feridas fecham.

quinta-feira, 26 de março de 2015

Poesia (22.0)

A escada

Degraus gélidos
Acariciam minha pele seca.
Não fazem cócegas
As roupas folgadas.
Meu rosto repousa
No pisar latente
De milhões de vidas
Sugadas por fumaça
E cimento.

A escada que me abraça
É a mesma que outrora
Derrubava meu copo de leite
Com sua precisão compassada
De barulho de chuva
No meio do outono gasto.

Não caem folhas.
Mas acalmaram-se os carros,
As pessoas,
Os restos de comida;
A vida acalmou-se.

Triste era ver
Pelo canto do olho
O sangue da testa vazando
Pulsante
Escuro quase preto
Sem luz ou refração necessária;
Sabia que era sangue
Pelo cheiro viscoso de vida
Indo em boa hora.
Embora soubesse que a vida
Era uma carta que se espera
Ansioso,
Que chega quando é menos esperada;
Borbulhando,
Derramando o leite quente no fogão,
Esfriando na calada da noite os pés pra fora
Do cobertor dantes não usado.

A vida;
Presente que chega ao fim do dia
Envolto em papel bonito
Com cheiro de papelaria de bairro
E é rasgado ao meio,
Em quartos,
Em pedaços menores que quartos,
No chão do quarto,
Bagunçando o assoalho,
Deixando o rastro de felicidade e vida
Na marca latente
Dos pés de homens mal servidos
De felicidade e vida
Que construíram e edificaram
As escadas da minha felicidade e vida.

A vida como a escada
Daqui de casa
É massa dura
Que me abraça na madrugada
E me derruba o jantar.

Escolha minha subir e descer
Sem ajuda.
Marcando o passo das milhões de vidas
Que passaram nesse chão
Antes da minha;
Marcando o compasso da música dançada
Nesse chão mole
De mangue vivo
No qual sangraram
Homens vivos
Na terra agora morta
Por cima de homens mortos
Outrora vivos
Que nunca saberão
O que é
Uma escada.

Que me ocupe agora
Eu
Do balançar desse subir e descer
Pra saber achar,
Nessa busca incessante
Por claridade,
Abraçar também
O chão,
A vida,
O descer
E a escuridão.

Pois não só de claridade
Faz-se o dia.

Esqueceram-se de nos dizer
Que o balanço
Balança
Doze horas na luz que mata
E doze horas
No breu que descansa.

segunda-feira, 16 de março de 2015

Poesia (21.9)

Flying Rivers

Taken care of
I am
By my lonely soul.

History has written itself
With its dirty ink
Throughout my body
And made it rot.

I see my harbor
From a great distance;
In the translucent water
That reflects
My rotten spirit
For not being able to reflect
This dead body of mine
I do not see myself.

Relentless is my struggle.

No one ever asked me
If the sailing amused
My reluctant mind.

It does not.

I am not for the waters.
Waves now make me nauseated.
I beg that you leave me
Cast away
In the dark sand
Of this unknown beach.
Leave my thoughts alone
For myself
Or the devil
To take care of.

Leave my dream of this ancient ocean
Rest mumbling watery words
As lost as the foam
That now I have become.

For foam I am
And no body must I have
Just to lick the unknown sand
Shall I desire.

For foam and ashes
Still to burst out of this shore
As soon as my own skin
Floats to me
My sanity will I recover.

Waiting for you to leave
And hope that I
Alone will crave
To sanity again.
To my own self.

My ocean is waterless,
No international part of me
Shall be conquered,
Because no ship shall sail
In the dark foam
That my body has become.

Thus the wind
May take me,
As the water
I no longer trust.
As long as foam I am
Shifting across the earths is needed
In order to find
The new elements
For this yet to come
Body of mine.

Will I find roots?
Silent was the wind
To my inquiry.


quarta-feira, 11 de março de 2015

Poesia (21.8)

Amontoado

Faltam palavras.
Rumores desconcertados
Lavados com um banho.
A poesia não mais transborda,
Os olhos secos não choram,
A brasa que mata
Enche meu nariz de dor.
A fumaça velha
Enegreceu os olhos
Castanhos agora,
Sem malícia
Cansam-me as palavras.
Insuficientes e fracas
Saem atropeladas
De mim
Mesmo assim.
Não gotejam mais
As veias abertas,
Balançam dormentes
Meus braços estirados
Ao longo da minha existência.

Como quem espera as flores
Num inverno recém chegado
Acalanto minha preocupação
Sem anteceder qualquer dor.
Deixei de sentir as presenças
De sentimentos desse plano.

Material para escrever minha solidão
Ou meus dessabores
Faltam nas prateleira das errantes.

Gritos uivam na noite
Sem vida selvagem para reclamá-los seus.
Um amor cansado
Cheio de preposições e pronomes.

No fim das palavras
Encontro um homem abaixado,
A luz do poste saboreia suas costas,
Agachado no muro
Lamenta baixinho
E grita por mim
Sua tristeza sem fim.

Sons não são palavras.
Movimentos não contém mais sentido.

O homem recolhe as flores murchas,
Tranca uma pequena fechadura em seu peito,
Atira a mim o molho de chaves
Com mais chaveiros que possibilidades,
E se joga aos céus
Torcendo para encontrar palavras de novo,

Vejo tal homem ir embora.
Paro no muro do fim das palavras,
Tenho flores comigo,
O inverno findou,
Agacho no meio fio
E luzes tremem sobre o meu pescoço.
Procuro no molho de chaveiros
A possibilidade de trancar meu peito.

Não encontro palavras.

Sem palavras

Encontro apenas
O fim.

domingo, 1 de março de 2015

Poesia (21.7)

Inerte

Das costas rasgadas
Não saem mais asas.
Não voam mais
Os sonhos de outrora.
Relento é agora
Meu braço doído
Que me é travesseiro
Nas noites claras.

A poesia enfraquecida
Já não expressa mais
Dor alguma.
Perdeu-se no emaranhado de vezes
Que tentou se escrever.
Mas sai inerte de mim
Sem que ao menos considere
As dores que poderia abrigar
Nesse fim.

Não talho
Nem mimo
Nem minhas próprias palavras
Rimo.
Ou rimo.
Sem destino.
Escrevendo por horas,
Tardes são as horas que escrevo.
Não constam em meu relógio
Todas as horas do dia.
Perdidas estão,
Oras.

Meu pescoço dói.
Meus olhos pesam.
Não é poesia o que faço,
Mas descrição sóbria
Do meu corpo enfraquecido.

Vejo os minutos mudarem de cor,
E penso se poderia estar eu
Em algum lugar chuvoso
Debaixo d’água
Pedindo para que tudo molhasse;
O gelo leva embora
O meu enjoo,
Mas deixa o meu enojo
De tudo que sofri.

Grato pela vida,
Por cada pedaço de bolo
E cada pedaço de dor
Que me foi dado.

Só não consigo escrever;
O limite da dor
Que não me transborda às palavras
Pois lágrimas não mais caem,
Nem gritos mais enlouquecem.

Puxo meu cabelo
Fio a fio
Num ato de desespero
Por sentido.
Não tenho cabelos.

Não tenho mais palavras.
Nem a mim mesmo
Eu tenho.
Passei a ser apenas
E isso é pouco.

Ser é pouco.
Queria estar mais.
Se não hoje,

Amanhã é capaz.