sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Poesia (8.6)

A Chegada das Horas

Tossindo sangue.
Caindo.
Segurando-me em paredes mal acabadas.
Andando torto,
Sem sapatos.
Indo pra casa.
Finalmente.

Desculpe.
Tenho que ir.
A hora chegara
Há muito.

Desculpe
Deixar sua casa assim
Tão rápido.
Mas algo me chama.
Algo que eu preciso buscar.
Algo que eu tenho que aprender a amar.

Fomos grandes amigos.
Companheiros de coisas que eu nunca
Imaginara fazer.
Queria que as coisas fossem melhores.
Queria que as pessoas soubessem que foi lindo.

Desculpe-me por ter ido.
Alguém tinha que ter dado o primeiro passo.

Espero me achar de novo
E aprender a me amar como deveria ter sido.
E espero depois encontrar você
E que sejamos diferentes,
E que sejamos melhores.
E que saibamos que a hora chegara, por fim.

Poesia (8.5)

Silêncio

Silêncio gritado
Expurgado da minha garganta.
Como quem briga,
Como quem fazer uma rebelião.

Silêncio estranhado.
Máscaras velhas,
Arruinadas.
Máscaras cansadas,
Sonoras, estardalhantes.
Escandalosas e falsas.

Máscaras emprestadas
Ao longo do tempo
Que se confundiram com meu rosto.

Mas o silêncio é meu.
Sou eu quem grito essas palavras caladas.
É minha garganta que se cansa de tanto silêncio.

Minha voz me foi roubada.
E eu não tenho interesse de procurar seu ladrão.
Não tenho a mínima vontade de recuperá-la.
A mínima vontade de ter minha voz de volta.
Quero ficar calado.
Sentado.
Parado.
Esperando
Minha voz achar seu caminho de volta
À minha garganta.

Sim.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Poesia (8.4)

Espuma

Saí do mar,
Caminhei pela areia.
Cortei meus pés em rochedos,
Sangraram de dor meus olhos.

Conheci novos mundos.
Vi espelhos
Que me viram
Assustados, curiosos.

Fitei a vida que eu almejara
Há tanto.
Almejei por fim fitar a água
Salgada mais uma vez.

Quero voltar;
Cortado, calado, sem ar.
Pisar nesse mar e deixá-lo
Ser em mim;
Curar minhas pernas cansadas.

Vai arder.

Mas serei capaz de respirar
Por fim.

Quero voltar,
Voltar ao mar.

Mas se eu o fizer
Talvez espuma
Tenha sido o que me sobrou dele.
Talvez seja espuma
O que eu me torne
Ao tocá-lo de volta...

Talvez espuma seja o que eu queira me tornar...

Poesia (8.3)

Ciclo da Chuva

Uma noite inesperada;
Uma semana corrida;
Uma coruja molhada;
Um pedido sem saída.

Um ano, dez meses e uma vida.
Separados por tantos,
Unidos por poucos.

Continue andando, meu amigo,
Que a vida é pouca
E o amor é muito.

Não posso lhe dar minha mão
Se você não quiser minha vida,
Pois junto com tudo
Vem antes
Meu coração.
Deixei meu Parnasiano em seu retiro.
Trouxe ou, até mesmo, veio comigo
O mais ultra dos meus Românticos.
E é ele que toma as rédeas aqui.

Foi o meu Romântico
Que fez chover
Quando precisávamos de água.
Foi ele quem te deu aquela coruja encharcada
E é ele quem chove nas noites caladas.

Não espere nada mais do que isso
Pois de mim não terás.
Senta-te quieto na escadaria do antigo
Lugar sagrado
E chovas tuas lágrimas
Em cima de coco e prata
Pois minhas chuvas não mais
Molharão teus pés.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Poesia (8.2)

Noite Opaca

Noite opaca.
Estou deitado à sombra de uma árvore,
Estou deitado à sombra de uma esperança,
À sobra de um querer,
À sobra de uma dúvida
De um sol que está incerto
Sobre o seu nascer.

Estou imerso nessa noite,
Imerso em mim e à sobra de uma vida que tive.
À sobra de um sol que me ofuscou por muito
Mas nunca me aqueceu.

Faz frio aqui.
O vento passa rasgando meus lábios,
Estremecendo meus dedos.
Estou cego
Deitado à sombra de um eclipse eterno.

Deitado em meio a vozes
Que me dizem tudo
Menos o que eu realmente preciso ouvir.

Mergulhado nessa água turva
Inquietantemente poluída
Eu me debato.
A água não se move.
Não há ondas nessa sombra.
Não há mais ondas em mim.
Não há sequer movimento.

domingo, 11 de setembro de 2011

Poesia (8.1)

Gula

Aprendi a degustar a dor
Como quem degusta um cultuado prato estrangeiro.
De garfada em garfada
Aprecio o sabor
De noites mal dormidas.

Sou servido com classe
E moderação.
Meu paladar refinado agradece
Os novos sabores
Que de gota em gota
Preenchem minha dúvida
Com a amargura anciã.

Como paulatinamente
Tudo que me é proposto à mesa.
Entrada e prato principal
Se fundem num excesso refinado
Em que eu
E eu apenas
Sacio as vontades do sofrer.

Então satisfeito
Abraço a dor
Na velha conhecida madrugada
E deito em seu ombro
Desejando ser menos de mim
E mais dela.
Desejando comer por fim
Minhas lágrimas
E aprender a digerir a dor que cerca
Meu mundo
Há mais tempo do que o tempo pode recordar.

Esse prato de sabor amargo e sofisticado
Que me forço a gostar
Que me obrigo a apreciar
Está a se perder
E posso ver o aroma doce vindo com o vento;
Mas por enquanto
Tenho pena de mim no fim de tudo
Por querer apenas
Força a reverência a essa sofisticação dolorosa.